quarta-feira, 21 de novembro de 2012

O ritual do Pagode

Este blogue é um blogue bem geral, e por isso eu coloco de tudo aqui...

Ando ponderando muito sobre a questão do negro, as religiosidades brasileiras, a musicalidade brasileira, etc.

Segue um texto de Martinho da Vila sobre "o Ritual do Pagode"



O RITUAL DO PAGODE


Batuques, pagodes, partidos-altos, batuqueiros, pagodeiros e partideiros se confundem e se fundem, desde o início quando tudo começou nas senzalas.

Há diferenças musicais imperceptíveis entre o partido alto e o samba de partido-ato. Este é quase um samba de terreiro atualmente chamado de “quadra” que são feitos para animar os ensaios. Tem a primeira parte definida e a segunda improvisada em maiores regras. Já o partido-alto é composto com um refrão e uma parte improvisada em cima do tema. Tem característica rítmica definida e maneira especial de dançar. O partido-alto creio eu surgiu nas rodas de batucadas que já não existem mais...Ah! como eram emocionantes. Nas escolas de samba, quando terminavam os ensaios e as visitas iam embora, começavam as batucadas.

Eram um barato! Recolhidas as peças de bateria, ficavam somente um ou dois pandeiros. Formavam-se uma roda, o partideiro puxava o refrão, a turma repetia e firmava o compasso com palmas de mão. Seguia-se um desafio de versos e pernadas. No meio da roda, um partideiro animando e um outro “plantado”, isto é, parado com os calcanhares juntos, braços abertos para equilibrar melhor o corpo, joelhos meio dobrados e olhos atentos nos pés de um outro, que dançava para distraí-lo, devagar, devagarinho, gingando e fazendo mesuras para, repentinamente manda-lhe uma rasteira. Podia se dançar em volta do “plantado”, mas não se dava rasteira por traz, isto é, ninguém “pegava” pelas costas, muitos preferiam “plantar” com os joelhos e ponta dos pés unidos, calcanhares separados, mais em ambos os casos, o ”plantado” não podia se mexer. Os mais folgados plantavam com uma perna só e a outra fazendo um quatro, o que facilitava muito o corcoveio ou o salto de banda, mas, nesta posição o parceiro preferia sempre bater “o firme” e quando pegava de jeito a queda era feia. Muitos braços se quebravam nas batucadas. Alguns especialistas batiam de “letra” o parceiro caia de lado. Era desmoralizante. Neste caso o batuqueiro que aplicava a “letra”, corria o risco de cair se o “plantado” estivesse bem firma no chão. Mais desmoralizante ainda. O “amarrado”, era a pernada mais bonita. Com o joelho desequilibrava-se o parceiro e encaixava-se o gancho com a mesma perna. Não era necessário força e a queda era lenta.

Os grandes batuqueiros eram chamados de “pernas”. Lucas era um reduto de “pernas”. Eu ainda miúdo batuquei com muitos “pernas” famosos como Timboca, Juarez, o Ailton Cuiqueiro e o Murilão, todos da Boca do Mato, bem como o Clovis e o Valdô Tigre, ambos da Água Santa, ou o Jonjoca e o Xisto, mestre-sala da Cachoeirinha e o Tidoca do Cabuçu. O Guarnair da Chave de Ouro, no Tabuleiro da Bahiana, na Cachoeirinha, na Cachoeira e nos piqueniques da Moreninha e Paquetá, locais de reunião de grandes batuqueiros.

As batucadas se acabaram, mas a dança do partido alto ficou. E como é bonito nos pés do Ubirani do Cacique, bem como nos pés do Paulinho da Viola, Dona Ivone Lara, Itacy do Império, Tia Nenen e Tia Zezé do Salgueiro, Genilsom Veneno da Mangueira, Dona Doca e toda a Velha Guarda da Portela.

Enquanto o canto do partido ganhou novas formas, penetrou nos grandes acontecimentos musicais, entrou no disco e atingiu o consumo, os pagodes onde são incluídos todas as formas de samba dançavel livremente, foi chegando de mansinho e continua ganhando terreno. Dos fundos de quintal dos subúrbios, foi para as portas de botequins, no centro da cidade, casas noturnas, teatros.

O pagode é uma festa e como gênero de música é qualquer samba com a linguagem e temas do cotidiano. A Fina Flor do Samba, no Teatro Opinião era um grande pagode assim como foi também o Zicartola, organizado em 64 na rua da Carioca e, mais ou menos na mesma época Candeia organizava o grupo de pagodeiros registrado em disco como Mensageiros do Samba, do qual faziam parte o próprio Candeia tocando cuíca, e mais, Casquinha, Bubu, Davi do Pandeiro, Arlindo e Picolino. O Zicartola deu origem ao grupo Rosa de Ouro formado por Paulinho da Viola, Nelson Sargento, Jair do Cavaquinho, Elton Medeiros, Anescarzinho, Aracy Cortes e Clementina de Jesus. Que maravilha era o Rosa de Ouro! Alguns anos depois o grupo passou a se chamar Os Cinco Crioulos com Mauro Duarte em lugar de Paulinho da Viola que ganhava vida própria, assim como Aracy e Clementina. Zé Keti também na briga deu a sua colaboração com o grupo A Voz do Morro, que no duro do duro, era a mesma patota: Elton, Jair, Anescarzinho e Paulinho acrescido de Zé Keti, Oscar Bigode e Zé Cruz que tocava chapéu de palha e depois o grande Nelson Sargento. O pagode já está acontecendo no ambiente familiar dos apartamentos.

Pra se formar um pagode em casa, basta reunir um grupo de amigos que esteja a fim de vadiar em comunidade, servir cachaça, cerveja e batida como bebida; mortandela, salaminho e pastel ou qualquer outro salgadinho como petisco. Colocar um disco na vitrola e deixar o pessoal batucar em cinzeiros, garrafas, copos, pratos, panelas, cada um a sua maneira, tentando acompanhar o ritmo. Os mais desinibidos devem incentivar os outros a libertar o corpo, soltar as gargantas, mexer com as mãos. Devagarinho vai se criando o clima, e antes da terceira hora o pagode esta formado. Por favor, nada de serviçais uniformizados. Misturem os empregados com as revistas, pois negro trabalhando em pagode sem poder participar é tortura. Bem, fica melhor sem aparelhagem de som, mas tem que ter uma boa turma que esteja por dentro dos refrões e partidos, um que toque tan-tan, outro pandeiro, um outro mais cavaquinho em pagodeiro que saiba puxar os sambas que a gente bota no ar, mas não podem faltar os sons do Zeca Pagodinho, do Almir Guineto, Bezerra da Silva, Grupo Fundo de Quintal...

No dia seguinte, uma sensação de liberdade, assobios pelas ruas, mãos batucando nos volantes do trânsito congestionado.

Atenção! É importante que as bebidas quentes sejam trazidas pelos convidados e que as geladinhas sejam compradas na hora, aos poucos, com todos participando da vaquinha.
Tem mais. Pagode sem mulher dando sopa não dá pé e só fica realmente “da pesada” quando rola uma sopa com várias colheres no mesmo prato pra se tomar em conjunto. É o ritual.


Texto extraído da contracapa do disco Martinho da Vila Batuqueiro (1986), gravadora RCA.



sexta-feira, 9 de novembro de 2012

OSHO - Inteligencia e rebeldia

Inteligência: Sabotadora do Status Quo

A miséria não necessita de nenhum talento, qualquer um pode consegui-la. A felicidade precisa de talentos, gênio, criatividade. Somente as pessoas criativas são felizes.

Deixe isso penetrar fundo em seu coração: somente as pessoas criativas são felizes. Felicidade é um subproduto da criatividade. Crie alguma coisa e você será feliz. Crie um jardim, deixe-o florescer e alguma coisa florescerá em você. Crie uma pintura e algo começa a crescer em você com o crescimento da pintura. Quando a pintura chega ao fim, enquanto você está dando os últimos retoques na pintura, você verá que você não é mais a mesma pessoa. Você está dando os últimos retoques para algo que é muito novo em você.
Escreva um poema, cante uma canção, dance uma dança e veja: você começa a ficar feliz. A existência apenas lhe deu uma oportunidade de ser criativo: a vida é uma oportunidade de ser criativo. Se você for criativo, você será feliz.

Quando você quer escalar o mais alto pico das montanhas, isso é árduo. E quando você alcança o pico e você deita para descansar, murmurando com as nuvens, olhando para o céu, a alegria que preenche seu coração; essa alegria sempre chega quando você alcança algum pico de criatividade.

É preciso inteligência para ser feliz, e as pessoas são ensinadas a permanecer não inteligentes. A sociedade não quer que a inteligência floresça. A sociedade não necessita de inteligência; na verdade a sociedade tem muito medo da inteligência. A sociedade precisa de pessoas estúpidas. Porque? Devido a que pessoas estúpidas são manipuláveis. As pessoas inteligentes não são necessariamente obedientes; elas podem obedecer, elas podem não obedecer. Mas a pessoa estúpida precisa de alguém para comandá-la, porque ela não possui nenhuma inteligência para viver por si própria. Ela quer alguém para dirigi-la; ela procura e busca seus próprios tiranos.

Os políticos não querem que a inteligência aconteça no mundo, os sacerdotes não querem que a inteligência aconteça no mundo, os generais não querem que a inteligência aconteça no mundo. Ninguém realmente a deseja. Eles querem que todo mundo permaneça estúpido, assim todo mundo é obediente, conformista, nunca sai fora do rebanho, permanece sempre parte da multidão, é controlável, manipulável, manobrável.

A pessoa inteligente é rebelde. Inteligência é rebelião. A pessoa inteligente decide por si própria se diz sim ou não. A pessoa inteligente não pode ser tradicional, ela não pode continuar adorando o passado; não há nada no passado para ser adorado. O inteligente deseja criar um futuro, deseja viver no presente. Seu viver no presente é seu jeito de criar o futuro.

A pessoa inteligente não se apega ao passado morto, não carrega cadáveres. Por mais belos que tenham sido, por mais preciosos, ele não carrega cadáveres. Ele acabou com o passado; este se foi e se foi para sempre. Mas o tolo é tradicional. Ele está pronto para seguir o sacerdote, está pronto para seguir qualquer político estúpido, pronto para seguir qualquer ordem; qualquer um com autoridade e ele está pronto para se jogar aos seus pés. Sem inteligência não pode haver nenhuma felicidade. O homem só pode ser feliz se for inteligente, totalmente inteligente.
A meditação é o meio de liberar sua inteligência. Quanto mais meditativo você for, mais inteligente você se torna. Mas lembre-se, por inteligência não quero dizer intelectualidade. Intelectualidade é parte da estupidez.

Inteligência é um fenômeno totalmente diferente, ela não tem nada a ver com a cabeça. Inteligência é algo que vem de seu próprio centro. Ela brota em você e com ela muitas coisas começam a crescer em você. Você se torna feliz, você se torna criativo, você se torna rebelde, você se torna aventureiro, você começa a amar a insegurança, você começa a se mover para o desconhecido. Você começa a viver perigosamente porque essa é a única maneira de viver.

Para as pessoas estúpidas existem super avenidas onde as multidões se movimentam. E por séculos e séculos elas têm estado se movimentando, indo a lugar nenhum, girando em círculos. Assim você tem o conforto de que você está com muitas pessoas, você não está só.

Inteligência lhe dá a coragem de estar só e a inteligência lhe dá a visão para ser criativo. Surge um grande anseio, uma grande fome para ser criativo. E só assim, como uma conseqüência, você pode ser feliz, você pode estar contente.

Osho, Extraído de: The Book of Wisdom